Empreendedores do Alto Tietê explicam importância da moda e cabelo afro para elevar autoestima negra
20/11/2024
Kessy Moraes, trancista e empresária de Suzano, e Otavio Henrique, empreendedor do ramo da moda, contam ao g1 como a valorização estética influencia na autoestima e empoderamento da comunidade negra. Lucrécia Moares, conhecida como Kessy, e Otavio Henrique, elevam a autoestima negra através do cabelo afro e da moda
Montagem/g1
Levar autoestima para negros e negras por meio de tranças e da moda. Esse é um dos objetivos do trabalho da trancista e empresária Lucrécia Moraes, de Suzano, e do empreendedor da moda Otavio Henrique, de Ferraz de Vasconcelos.
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No dia em que é celebrado o Dia da Consciência Negra, empreendedores do Alto Tietê contam ao g1 como a indústria da moda e da beleza contribui para o empoderamento da comunidade negra.
Importância do cabelo afro
Trançar cabelos afro para elevar a autoestima de mulheres negras. Este é o ofício que acompanha há mais de 30 anos a vida da empresária Lucrécia Moraes, que prefere ser chamada de Kessy, moradora de Suzano. Segundo ela, o talento para trabalhar com o cabelo vem de família: a tia e madrinha Cida, especialista no "pente quente", antiga técnica usada para alisar cabelos, viu que Kessy levava jeito com as tranças.
"Ela fazia alisamento à chapinha. Não sei se você lembra, daquela chapinha que ia na boca do fogão. E ela trabalhava há muitos anos com essa chapinha. Chegou um dia, uma cliente queria fazer uma trança e ela [tia] não sabia fazer trança. Mas ela já via em mim que já tinha dom. Ela só explicou como fazia. Eu comecei a fazer e ali começou o meu chamado de mexer com cabelo. E hoje eu sou a trancista Kessy, que há tantos anos está aqui em Suzano fazendo arte na cabeça das pessoas", explica.
Kessy Moraes trabalha como trancista há mais de 30 anos
Arquivo Pessoal/Kessy Moraes
Para Kessy, o trabalho desenvolvido como trancista carrega um significado que vai além da beleza estética.
“A trança veio da África. E o cabelo trançado, em si, significava o mapa. Era como os negros fugitivos trançavam o cabelo para mostrar a rota, para onde eles iam fugir. O interessante de tudo isso é que eles colocavam uma sementinha no meio das tranças. Porque onde eles chegavam, onde eles iam parar, no quilombo que fosse, eles tinham sementes para produzir o que eles iam comer. Então, nosso cabelo tem história, não é somente uma trança. Meu cabelo tem história”, diz a trancista.
Raquel Dutra, de 65 anos, faz questão de trançar os cabelos no salão de Kessy há cerca de 20 anos. Ela afirma que o cuidado com o cabelo é responsável pela maior parcela da beleza feminina e autoestima da mulher.
Por isso, Raquel acredita que, a partir de uma maior autoaceitação estética por parte da população negra, houve uma transformação nos padrões de beleza.
“Antigamente, a mulher com cabelo crespo era discriminada, não era aceita. Todo lugar você sofria, a gente sofria preconceito, desde o tempo de escola, sabe? Então, eu carrego trauma, até hoje, do tempo de criança. Hoje eu acho bom de ter condições de chegar num salão e fazer essa transformação no meu cabelo, porque eu vi o que eu passei quando eu era criança, quando eu era jovem, e como isso atrapalhou a minha vida, até em não querer estudar, não querer fazer as coisas. Porque você não tinha pessoas assim como a Kessy, pessoas de referência, que chegassem assim: ‘não, muda, faz assim’. Então, não existia isso nessa época”, diz Raquel.
Trancista e empresária explica como cuidado com cabelo eleva autoestima de mulheres negras
Moda como empoderamento
Vestir-se como os rappers dos Estados Unidos e do Brasil. Isso foi o que motivou o empreendedor Otavio Henrique, de 32 anos, morador da periferia de Ferraz de Vasconcelos, a criar e confeccionar peças de roupa a partir de 2012.
"De início, a gente só queria vestir umas peças que a gente via nos clipes de hip hop, que foi o que sempre influenciou a gente. E acabou que a gente ia fazendo esses modelos. Um amigo gostava, o outro gostava. Um amigo nosso estava com um dinheirinho que ele tinha pego de uma rescisão de um trabalho antigo e disse: 'olha, vamos dar um nome, vamos profissionalizar um pouquinho e vamos fazer'", conta Otavio.
Otavio Henrique cria peças de roupa streetwear desde 2012
Redes sociais/Otavio Henrique
A ideia amadureceu e deu origem a uma marca da roupas. Através do vestuário, o empresário afirma que encontrou uma maneira de expressar o gosto pessoal pela música, pelo hip hop, mas também de conquistar autoconfiança para a vida.
"O poder que uma roupa, uma simples roupa tem. Acho que você ter coragem de colocar uma roupa diferente, um kit diferente, pra não passar batido dessa vez. Você quer ser visto, você quer que as pessoas te reconheçam por aquilo ali que você fez, que seja diferente, mas se você teve a confiança de fazer isso aí e ainda sim você teve o mínimo de aprovação, que seja das pessoas que importam pra você, acho que isso aí também é muito gratificante e também joga nossa autoestima lá em cima".
Empresário explica importância da moda para a autoestima negra
Estética e autoestima negra para abrir caminhos
Kessy e Otavio são dois exemplos de como o trabalho com a estética negra, do salão de beleza até a confecção de roupas, influencia na autoestima do povo preto. Eles acreditam que a valorização da beleza negra é capaz da libertação de preconceitos.
O empresário vê a internet e as redes sociais como meios que fortalecem o empoderamento e a conscientização do povo negro.
“Influencia bastante de forma positiva pra gente que, apesar de ter ainda muito, muito preconceito, o mínimo que seja de melhora já é de grande ajuda. Eu imagino que vai melhorando. Cada vez mais a gente vai ter representatividade entre homens e mulheres pretas ocupando espaços aí, que são importantes, além da excelência, que sempre foi na música, nos esportes”.
A trancista e empresária também identifica avanços e conquistas para o povo negro. Porém, ela ressalta que o combate ao racismo deve ser contínuo.
"Hoje, graças a Deus, a gente vê que o pessoal negro, as meninas negras, as mulheres negras, estão conseguindo um espaço maior. Mas a vida continua, o preconceito continua. A luta vai ser sempre, só que a autoestima hoje foi mudada, foi transformada".
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